segunda-feira, 7 de abril de 2008

silêncio!

Foi só o que escutei quando me calei. Senti uma pressão maior no nariz. Maior fluxo de ar. Me agoniei. Mas a boca mantinha-se fechada. Não iria abrí-la por nada. Não falaria nada. Seria apenas eu e eu mesmo. Ninguem mais iria saber nada de mim. Ficaria com minha dor sozinho. A guerra não era minha, mas eu sabia demais. Não lutava por nenhum dos dois lados, e talvez por isso mesmo tenha tido acesso a tantas informações confidenciais. Até o belo dia em que decidiram falar que eu estava espionando. Agora estou aqui jogado nessa merda de cela de 2x1,5m, apenas de cueca. Lugar úmido de merda. Só sei quando começa o dia quando é servido um pão que mais parece pedra. Mas sei que não posso contar com isso. A noção do tempo não existe, e eles podem embaralhar a alimentação e me deixar louco. Mas não, não vou ajudar nenhum dos dois lados nessa merda. Ninguem vai tirar nenhuma informação de mim. Iria me calar. Como pode-se prever, na cela não havia nenhuma faca, tesoura, ou algo cortante. No entanto a parede era áspera. Foi ali mesmo. Nunca mais iria falar nenhuma palavra. O sangue escorria. A dor era insuportável. Mas eu estava disposto a suportar. E ainda assim, não gritei de dor. Pensava comigo mesmo. Posso não falar. Mas há outros meios. Decidi que não seria o filho da puta responsável pelo fim de um povo. Mesmo que não fosse o meu. Estava fora de cogitação. E da mesma forma que foi a lingua, foram-se as mãos. Os pés. A cela cheirava forte à sangue. Eu não posso me levantar. Não tenho como me apoiar. Nem alimentar. A fome é tamanha que eu me arrasto pelo chão para chegar ao prato de comida, ou catar o pão com a boca. Enquanto isso, arrasto os ferimentos ainda não cicatrizados, e crio outros novos. Eis que finalmente abrem minha cela. Fico me perguntando quanto tempo será que fiquei aqui trancado. Escuto um alvoroço, mas não consigo compreender o que dizem. Meus ouvidos estão obstruídos por sangue seco. Pude distinguir apenas alguem gritar 'Silêncio!', passar algum tempo. E trancarem a porta de novo.