sábado, 5 de janeiro de 2008

nem faço questão

Eu fecho os olhos pra não ver, mas o que está dentro de mim, assusta ainda mais, me consome, me faz pensar que seria melhor não pensar. A luz que vem de fora e marca minha visão, dando formas na escuridão. Os vasos pulsando, o sangue me deixando tonto, essa posição não me é favorável. Minha mente, meu corpo, conexões desconexas me fazem falhar. Isso é tudo o que posso fazer, não exija muito de mim, minha capacidade é incapaz de confirmar a sanidade da minha mente, ou do momento. A confusão que se instala mostra que nada é rígido, exceto o fim. O fim que me faz ter vontade de olhar para dentro de meu corpo, mas não vejo nada, apenas a escuridão. Ou seria isso o que há em mim, apenas escuridão? Um nada? Não sei, nem faço questão. Estando morto ou vivo, a escuridão que eu vejo, não é a mesma que você. O encontro que tenho comigo, jamais será o mesmo que o seu. Abrir os olhos é irritante, até um pouco constrangedor, me sinto nu. Tudo que penso transborda pelos olhos, todos vêem, todos sentem. Que merda! A claridade das pessoas me incomodam, me faz ter vontade de fechar os olhos novamente e me enfiar em minha própria escuridão.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

o fim

O dia acabou de cair, eu chego do trabalho, literalmente morto, deitado num colchão confirtável. Vou seguindo de motorista até meu destino final. Passando perto do portão, ouço choros, soluços, e pessoas gritando, tento ver o que está acontecendo, mas não consigo, não consigo me mexer. O carro vai reduzindo a velocidade. Agora é pouco o som que ouço. Desço do carro com ajuda das pessoas, e fico alí, contemplando o que seria aquele céu azul, os pássaros voando, poucas nuvens no horizonte, e uma temperatura agradável. Gostaria de poder ver tudo isso, mas só vejo o preto. As imagens ficam em minha imaginação. Queria também poder sentir a brisa bater, sentir o sol queimando minha pele, mas já não sinto muita coisa...
Faz um tempo que estou aqui. Não sei se algumas horas, ou vários dias. Perdi a noção de tempo, mas não a de espaço.. como já disse, hoje sinto pouca coisa, e o pouco que sinto, são so vermes invadindo meu corpo, entrando pela minha boca, pelo meu nariz, fazendo de mim, a refeição da vez. Esse é o meu fim, morri salvando uma pessoa, e tenho o mesmo fim daquele que me matou.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Calor

A mente é revoltada, os olhos cerrados. Os punhos cheio de cicatrizes mostram que ele não veio prá cá de sacanagem, ele quer confusão e de alguma forma vai consegui-la. A polícia já por passou aqui tem algum tempo, e não deve voltar mais hoje, por isso ele se sente tão a vontade. O dono do bar já se preocupa, liga que nem um louco para o 190, mas não escuta nada além de uma gravação de merda. As duas putas na mesa virada para a rua, de pernas abertas estão tentando atrair alguns clientes da construção que tá sendo feita um quarteirão abaixo da rua. Decadente, esse lugar, com piranhas se oferecendo pros peões, em troca de uns trocados para poderem almoçar no outro dia. Uns traficantes ficam do outro lado da esquina onde fica o bar, e quando chegam jovens atrás de diversão, entram num terreno baldio, ao lado de um prédio vermelho-batom, caindo aos pedaços. Comprar drogas por aqui se transformou num lance tão banal, que se tu quiser uma entrega delivery, é só ligar pro delegado da região. Ninguém faz questão de esconder de ninguém. A garçonete com aquela minissaia branca, que já está com um marrom de gordura faz pelo menos uns cinco meses, parece uma cadela no cio perto dos garotos que chegam. A filha do dono do bar, fica na janela da casa em cima do bar, com um decote gigante, de tecido branco, respingado de água que ela faz questão de jogar na cara e no decote pra se refrescar do calor sufocante. Todo mundo ali no bairro se esvaindo em suor. A pele gosmenta, as roupas colando, e um bafo quente que faz arder os olhos. Acabara de cair uma chuva fina que deixa o calor ainda mais insuportável. O cheiro de asfalto molhado entrando pelas narinas e incomodando mortalmente quem tenta alí viver. Costumo dizer que todos alí já estão mortos, porque é o próprio inferno. A mulher do dono do bar tenta, sem sucesso fazer o ventilador voltar a funcionar. Malandro dentro do boteco já começa a ficar puto com o cheiro do cigarro, misturado com o forte odor de suor exalado pelos corpos úmidos. E as mãos dele estão ficando nervosas, tremem como se ele tivesse mal de parkinson. A agonia é grande, e o motivo, o destino já lhe fez o favor de dar. Põe a mão na cintura, confere as duas pistolas que carrega, olha ao redor, todos estão mais preocupados em dissipar o calor do corpo que nem ligam com aquele homem com duas pistolas nas mãos. Bebe mais uma dose de whisky pra terminar a garrafa, põe o dinheiro da conta na mesa, e dá dois tiros na cabeça, um de cada lado. O calor aumenta, as pessoas olham pro corpo no chão, depois voltam-se para o que estavam a fazer. O mulher do dono do bar pega um balde e uma vassoura, para limpar o chão, enquanto seu marido arrasta o corpo para trás do balcão, e com uma peixeira, esquarteja o suicida. Depois coloca suas partes num saco de lixo, que sua filha leva para fora.